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Hepatite – Conscientização sobre esta doença global

22 de Agosto, 2024by Margarida Marques
Segundo a Organização Mundial de Saúde – OMS –  a Hepatite causa mais de 1 milhão de mortes todos os anos, com cerca de 3 milhões de novas infeções registadas anualmente.

 

O Fígado é um órgão que exerce várias funções no organismo tais como armazenamento de energia, eliminação de toxinas e ajuda no processo da digestão. A Hepatite consiste na inflamação das células constituintes do Fígado (hepatócitos). Quando se desenvolve esta inflamação, o fígado deixa de conseguir desempenhar as suas funções podendo originar diversas complicações a curto ou a longo prazo. Este tipo de inflamação pode ser autolimitada ou progredir para uma fibrose, uma cirrose ou um cancro hepático.

 

Existem diversas etiologias para a Hepatite, as Víricas (A, B, C, D, E e G) cada uma causada por diferentes vírus, variando em nível de gravidade e formas de transmissão, a Auto-imune, Tóxica (provocada por algum produto tóxico tal como álcool ou fármacos) e a Doença hepática gordurosa não alcoólica (mais conhecida por fígado gordo).

Em termos de apresentação clínica temporal, são classificadas como Hepatite aguda – quando os sintomas possuem uma duração inferior a 6 meses ou Hepatite crónica – quando a inflamação do fígado é superior a 6 meses.

A gravidade desta doença varia conforme o tipo de hepatite. Em muitos casos, pode até nem desenvolver quaisquer sintomas. No entanto, quando se manifestam, os sintomas mais descritos são a fadiga, a perda de apetite, náuseas, vómitos, diarreia, urina escura, fezes claras, dores abdominais e a coloração amarela da pele e dos olhos (icterícia).

 

Tipos de hepatite:

 

Hepatite A

 

É causada pela infecção do vírus da hepatite A – VHA.

É altamente contagiosa e a sua transmissão é pela via fecal-oral, usualmente, de pessoa para pessoa ou através de alimentos e águas contaminadas com o vírus.

É um tipo de infeção comum em Portugal, surgindo geralmente na infância ou no jovem adulto.

Pode ter uma apresentação subclínica ou apresentar os primeiros sintomas 30 dias após o contágio. Cura-se ao fim de três a cinco semanas e não evolui para doença crónica.

Os sintomas iniciais são idênticos aos da Gripe como febre, dores musculares e mal-estar geral, depois surge icterícia, falta de apetite e vómitos.

Como tratamento é aconselhado o repouso e uma dieta rica em proteínas e baixa em gorduras.

Uma vez infectada é desenvolvida imunidade permanente.

A sua prevenção passa por medidas de higiene básicas como a lavagem das mãos e, no caso de zonas sem saneamento básico, optar por beber água engarrafada e ingerir alimentos embalados.

Este tipo de infeção tem Vacinação que é recomendada para pessoas que viajam com frequência ou que permanecem longos períodos em países como: Ásia, África ou América Central e do Sul onde a infeção é endémica.

 

Hepatite B

 

É causada pela infecção do vírus da Hepatite B – VHB.

É transmitida através da exposição a sangue ou fluidos corporais infectados, partilha de seringas, contato sexual, transmissão vertical de mãe para filho, tatuagens, piercings e em procedimentos Médicos e Médico Dentários onde exista falha no processo de esterilização do material cirúrgico.

Os sintomas na Hepatite B aguda são semelhantes a uma gripe e na maioria dos casos é uma infeção auto-limitada que não necessita de tratamento. No entanto, cerca de 5% dos doentes evoluem para uma infecção crónica. A principal complicação da hepatite B crónica é o desenvolvimento clínico de cirrose, sendo que estes doentes apresentam também risco aumentado de cancro do fígado.

De acordo com a Organização Mundial da Saúde, em todo o mundo estima-se que este tipo de Hepatite tenha infetado dois mil milhões de pessoas sendo a causa de morte de 600 mil pessoas por dia. Em Portugal, a Hepatite B afeta cerca de 1% a 1,5% da população.

Nas formas agudas, o tratamento passa pelo repouso. Nas formas crónicas, recorre-se a medicamentos como antivíricos e interferões.

A prevenção é feita pela prática de sexo seguro (uso preservativos), utilização de instrumentos cirúrgicos/agulhas devidamente esterilizados ou descartáveis, não partilhar escovas de dentes, lâminas de barbear ou instrumentos de manicure que possam se encontrar contaminados e só permitir o uso de equipamentos perfurantes da pele devidamente esterilizados (tatuagem, piercing ou acupuntura). Outra forma de prevenção passa pela vacinação que apresenta uma eficácia de cerca de 95% – incluída no Programa Nacional de Vacinação.

 

Hepatite C

 

É causada pela infecção do vírus de Hepatite C – VHC.

É transmitida a partir do contacto com sangue infectado com o vírus (transfusões sanguíneas antes de 1992), pela partilha de seringas e agulhas contaminadas (tatuagens, piercings, acupuntura, instrumental médico, partilha de escovas de dentes, partilha de máquinas de barbear ou outros objetos que possam conter sangue contaminado. O contacto sexual é também uma forma possível de contágio, embora menos comum.

A hepatite C é um grave problema de saúde pública, onde a maioria dos doentes não apresenta sintomatologia e não desenvolve alterações hepáticas evoluindo com muita frequência para formas crónicas.

As principais complicações da hepatite C crónica é a sua evolução para uma doença hepática grave como o hepatocarcinoma, neoplasia maligna do fígado (60% dos casos em Portugal), e a cirrose hepática (25% das ocorrências em Portugal).

Em situações de doença hepática avançada, pode ser necessário um transplante de fígado.

Segundo a Organização Mundial da Saúde estima-se que existam 150 mil doentes com este quadro clínico em Portugal.

Quando apresenta sintomas estes passam por cansaço, falta de apetite, náuseas ou vómitos, dores musculares ou articulares e emagrecimento.

Nas formas crónicas o seu tratamento passa pela administração de peginterferão alfa-2, associado ou não a outras terapêuticas.

A sua prevenção é feita a partir do uso de instrumentos devidamente esterilizados ou descartáveis de uso único, não partilhar escovas de dentes, lâminas de barbear ou instrumentos de manicure que possam se encontrar contaminados e só permitir o uso de equipamentos perfurantes da pele devidamente esterilizados (tatuagem, piercing ou acupuntura).

Não existe vacinação para a hepatite C e é considerada pela OMS como o maior problema de saúde pública, dado que é mais transmissível pelo sangue que o HIV e é a maior causa de transplante hepático.

 

Hepatite D

 

É provocada pela infecção do vírus de hepatite D – VHD ou vírus Delta. Causada por RNA-vírus que isoladamente não apresenta potencial infecioso expecto quando associada à hepatite B, dado que agudiza este tipo de infecção.
Este tipo de infecção é endémica nos países mediterrânicos e a sua principal forma de contágio é por via sexual e pelo contacto com sangue contaminado.

Embora não exista vacina para este tipo, uma vez que o mesmo só pode infetar doentes com tipo B, a imunização contra a hepatite B previne igualmente a infeção por este vírus.

Este tipo de infecção é frequentemente encontrado em pacientes portadores do vírus HIV.

Trata-se de um tipo de hepatite menos frequente do que os três anteriores (A, B e C). O tratamento é realizado com interferon alfa.

 

Hepatite E

 

É causada pela infecção do vírus de Hepatite E – VHE.

É transmitida via fecal oral, através do contato com alimentos e água contaminadas, e os seus sintomas tem início em média 30 dias após o contágio.

Os sintomas principais são com febre baixa, fadiga, mal-estar, perda do apetite, sensação de desconforto no abdómen, náuseas e vómitos, icterícia.

É considerado um tipo de infecção leve, no entanto apresenta um risco aumentado em mulheres grávidas, principalmente no terceiro trimestre gestacional (podendo evoluir para uma hepatite fulminante), e em doentes imunodeprimidos (pré infectados com HIV ou doença autoimune).

O seu tratamento passa por repouso e terapêutica sintomática.

A sua prevenção é realizada através de medidas de higiene básica, devendo ser evitado o consumo de alimentos e bebidas contaminadas.

Segundo a Organização Mundial da Saúde estima-se que cerca de 4,2% da população portuguesa encontra-se infectada.

Está disponível vacinação nos países endémicos.

 

Hepatite G

 

É causada pela infecção do vírus da Hepatite G – VHG (vírus mutante do vírus da hepatite C).

Foi descoberta mais recentemente, em 1995 e estima-se ser responsável por 0,3% de todas as Hepatites víricas. Desconhecem-se ainda todas as formas de contágio possíveis, mas sabe-se que a doença é transmitida, principalmente, pelo contato sanguíneo (transmissão horizontal) e partilha de agulhas e materiais infetados.

Este tipo de infecção ainda se encontra em estudo não sendo ainda possível descrever com exatidão as consequências e os sintomas da infeção por este vírus. 

 

Outras hepatites virais

 

Outras infecções virais tais como: Epstein-Barr, citomegalovírus e o herpes zoster podem causar dano hepático. 

 

Hepatite autoimune

 

A Hepatite auto-imune caracteriza-se pelo ataque as células do fígado pelo próprio sistema imunológico, provocando uma reacção inflamatória e danos hepáticos a longo prazo.

É uma doença crónica, progressiva, grave, que se não for tratada pode evoluir para uma cirrose ou uma insuficiência hepática. Afecta 4 vezes mais o sexo feminino do que o masculino.

Existem duas formas desta doença: hepatite autoimune tipo 1, ou clássica (forma mais comum).

Afeta principalmente mulheres jovens e costuma estar associada a outras doenças autoimunes (diabetes tipo 1, tiroidite, colite ulcerativa, vitiligo ou síndrome de Sjogren). A Hepatite autoimune tipo 2 é menos comum e geralmente afeta meninas na faixa etária dos 2 e 14 anos.

Os sintomas mais comuns (quando ocorrem), são fadiga, desconforto abdominal, dores nas articulações, amenorreia, prurido, icterícia, hepatomegalia, náuseas e aranhas vasculares. Outros sintomas podem incluir urina escura, perda de apetite e fezes claras.

As complicações mais graves podem incluir ascite. Em 10% -20% dos casos, a Hepatite autoimune pode apresentar sintomas como a hepatite aguda.

O diagnóstico é feito através de exames sanguíneos e biópsia.

O tratamento consiste na supressão do sistema imunológico através de terapêutica corticoide. Na maioria dos casos, a Hepatite auto-imune pode ser controlada, mas não tem cura. 

 

Hepatite tóxica

 

O fígado tem como função principal o metabolismo e excreção de fármacos e produtos tóxicos.

A hepatite tóxica é a inflamação do fígado provocada por algum tipo de produto hepatotóxico que lesa diretamente os hepatócitos (células parenquimatosas do fígado responsáveis pelas funções metabólicas do fígado).

Os principais produtos hepatotóxico são os fármacos, álcool (Hepatite alcoólica), produtos químicos nocivos e alguns suplementos nutricionais de ervas e vegetais.

A toxicidade destes produtos depende sempre da quantidade ingerida e do tempo da ingestão.

A título de exemplo, o acetaminofeno (Paracetamol), substância antipirética e analgésica muito utilizada tanto em crianças como em adultos supostamente segura, pode ser hepatotóxica em doses maiores a 4g/dia.

A melhor forma de prevenir este tipo de Hepatite é o cumprimento da terapêutica prescrita evitando a automedicação e evitar o consumo de suplementos não certificados pelo INFARMED. 

 

Hepatite Alcoólica

 

A hepatite alcoólica – DHA –  é uma doença inflamatória hepática causada pelo excesso da ingestão de bebidas alcoólicas por um período de tempo prolongado, no entanto pode não estar necessariamente ligada à dependência ao etanol, mas a outros fatores predisponentes, genéticos e ambientais, como o vírus da Hepatite B e C, que possui prevalência de 30% nessa população.

Os sintomas mais comuns são icterícia, ascite (acúmulo de líquido na cavidade abdominal), perda de peso e anorexia, desconforto abdominal superior e hepatomegalia dolorosa à palpação, febre, fadiga e encefalopatia hepática (disfunção do cérebro devido à insuficiência hepática).

O sexo feminino é mais susceptível a lesão hepática dada as diferenças de composição corporal pois apresentam menor concentração álcool-desidrogenase (enzima responsável pela metabolização do álcool), no entanto a maior parte dos pacientes com quadro clínico de Hepatite alcoólica aguda tem entre 40 e 50 anos e são do sexo masculino.

Cerca de 90-100% dos alcoólicos desenvolvem doença gordurosa e, destes, 10-35% desenvolvem Hepatite alcoólica, enquanto que somente 8-20% dos alcoólicos crónicos evoluem para um quadro de cirrose.

O tratamento e a prevenção consistem na abstinência alcoólica.

Ela melhora o prognóstico, diminui as lesões hepáticas, a pressão portal, a evolução do quadro clínico para a cirrose e mortalidade.

É frequente nestes casos a desnutrição calórico-proteica, deficiências em vitaminas e minerais (como as vitaminas A e D, tiamina, piridoxina e zinco).

Em casos severos poderá ser necessário um transplante de Fígado.

 

Doença Hepática Gordurosa não Alcoólica

 

Doença hepática gordurosa não alcoólica – DHGNA – é o acúmulo excessivo de lípidos nos hepatócitos.

A doença hepática esteatótica associada a disfunção metabólica (DHEADM) é a infiltração gordurosa simples (uma doença benigna chamada esteatose hepática), enquanto que a forma mais grave da doença é chamada de esteato-hepatite e encontra-se associada a uma disfunção metabólica (EHADM) sendo caracterizada pelo excesso de acumulo de lípidos que leva a uma lipotoxicidade e a uma reacção inflamatória nos hepatócitos.

É uma das causas mais comum de doença hepática nos países desenvolvidos e será a principal causa de cirrose e transplante hepático no futuro.

A esteato-hepatite não alcoólica encontra-se intimamente associada a outras patologias como a obesidade, diabetes, hipertensão arterial, colesterol e triglicerídeos elevados.

DHGNA é mais comum numa faixa etária entre 40 e 60 anos de idade, mas pode afetar crianças e adultos mais jovens.

É mais comum no sexo feminino do que no sexo masculino.

O Tratamento e prevenção baseia-se numa dieta equilibrada, perda de peso e realização de exercício físico.

 

A consciencialização para as diferentes formas de Hepatite é de extrema importância dado que esta doença afeta mais de 50 mil doentes em Portugal e muitos ainda estão por diagnosticar.

O objetivo deste artigo é informar sobre sinais e sintomas e de alertar para a importância do seu diagnóstico precoce, de forma a permitir o acesso a tratamentos eficazes e céleres e de evitar a transmissão de novas infeções.

 

A Hepatite Viral é uma doença que pode ser prevenida e no caso de contágio é tratável. As Hepatites Virais B e C afetam mais de 350 milhões de pessoas em todo o mundo, causando 1,4 milhões de mortes por ano. Muitos dos doentes infetados não apresentam sintomas, sendo por isso primordial os testes de rastreio das Hepatites B e C no caso da existência de fatores de risco.

 

Outra forma e prevenção é a sua vacinação contra a Hepatite B (Programa Nacional de Vacinação desde 1995) e a Hepatite A no caso de viajar para países endémicos. contribuindo para a redução significativa da incidência desta doença.

Porém, a Hepatite C ainda carece de vacinação tornando-se crucial a adoção de comportamentos seguros, como o uso de preservativos e a não partilha de agulhas ou outros objetos cortantes.

 

Esteja atento, vacine-se e no caso de sintomas procura um profissional de saúde especializado. 

 

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